A carne-de-sol, meu sonho-pesadelo.

Assunto chatinho, desses de causar raiva. Assustar.

Para amenizar, um aviso aos desatentos. A foto acima é crepuscular. Dali há pouco, cairá a noite. Mais tarde, o sereno da madrugada. É nele que a carne-de-sol é produzida, não no sol. Desconheço razão, desconfio que quando descobriram que o resultado final da cura no sereno ficava melhor que a feita no sol, o nome já estava consagrado.

Apesar de ser o meu prato predileto, é certeza de sofrimento quando um cliente, inadvertidamente ou de surpresa, a inclui no leque de carnes do churrasco. Um inferno. Agonia medonha. Ainda mais e for uma picanhazinha-de-sol, que costumo lambuzar com manteiga-de-garrafa temperadinha com alho ou ervas. Vixe! Quase me afogo em litros de saliva, tanta a vontade de comer.

Mas não como nem a pau!

Há razões.

Em termos mais ou menos técnicos, o que distingue a carne-de sol das suas primas, a carne-seca e o jerked-beef, é o tempo e o processo de cura e a duração na prateleira. Estas últimas resultam num produto mais salgado, que exige a dessalga antes do preparo para consumo. São largamente industrializadas, possuem legislação específica e marcos fiscalizatórios.

A carne de sol, não. Toda a produção é artesanal e não conta com legislação que lhe dê identidade formal, com parâmetros microbiológicos e físico-químicos que garantam um produto padronizado e seguro para consumo. É obtida através de cura rápida em salga, possui vida curta na prateleira, 3 a 5 dias, e tem como vantagens o sabor peculiar e dispensar a dessalga: vai direto para a panela ou para a brasa, preferencialmente.

Portanto, rigorosamente, toda a carne-de-sol produzida no país vem de fabriquetas de fundo-de-quintal. Incluindo aquela que você consome, salivando, nos restaurantes ou mesmo festivais gastronômicos, a não sejam que eles sejam os próprios produtores, e sabe-se lá, em que condições.

O circo dos horrores está apenas começando.

Aqui no Rio, é fartamente encontrada e consumida em pequenos açougues, casas de artigos nordestinos, feiras típicas, restaurante e grandes hotéis. De onde vem, quem fabricou, ninguém sabe, ninguém viu, ninguém fala, ninguém confessa.

Uma questão relevante: o preço da carne fresca no frigirifico é o mesmo para um açougue ou para um pequeno fabricante de carne-de-sol. Mas os preços finais dos cortes da de sol praticados pelo comércio são meio encostadinhos nos preços da fresca. Cadê o lucro do fabricante e o do comerciante? Como os produtores de carne-de-sol conseguem carne-fresca tão barata? A sonegação é uma das respostas. Fábrica clandestina não precisa de nota-fiscal. Mesmo assim, a diferença do imposto não cobriria os custos de produção nem lucros satisfatórios.

Já os abates clandestinos, que pululam aqui no interior do Rio, precisam de clientes que não estão muito preocupados com a origem do animal e sua sanidade, nem o tipo (um burro velho, por exemplo, passa que é uma beleza) e precisam de carne baratinha. Quem? Quem? Uma bala para quem advinhar.

Certamente existirão alguns honestos, que utilizam carne inspecionada e cobram muito caro pelo seu produto. Não conheço um.

Mas o que não me sai da cabeça é a crendice disseminada sobre os poderes milagrosos do sal, que curaria tudo, inclusive que vem de ruim na carne de boi doente ou imprestável para o abate.

Pronto, esta a razão do meu sofrimento quando faço um churrasco que inclua meu prato predileto sem que eu conheça, de fato, a procedência. Aliás, não conheço nenhuma, senão a que sai da minha cozinha.

Mas nem tudo está perdido.

Fazer carne-de-sol é mais fácil do que você imagina.

Há anos, utilizava um processo meio litúrgico demais. Até que uma amiga, comovida com meu dilema, gente boa toda vida, me deu uma receita excelente com direito a vídeo, ensinando o passo-a-passo, facílimo para se obter uma picanha-de-sol (ou outro corte qualquer) que realmente fica divina.

Veja a receita e o filme aqui

14 comentários:

Amar Yasmine disse...

Não posso entender como um texto tão "saboroso" esteja sem comentários. Bm... sorte minha que inauguei.. rss...

Encontrei seu blog quando procurava no google as diferenças entre carne seca, carne de sol e outras do tipo.

Vc escreve gostoso demais. Tão gostoso quanto comer. Depois vou ler tudinho, como alguém que "raspa o prato".. hehehe... agora vou trabalhar.

Siga em frente.. *;-)

Doces besos!

Clovis disse...

Oi Ricardo, também encontrei seu blog pesquisando sobre carne de sol no Google. Sou nordestino, apreciador dessa iguaria e sempre ouvi dizer que ela só poderia ser produzida no clima do semi-árido do nordeste - ainda bem que era uma mentira - obrigado pela receita e pelo texto, muito bom.
Vou acompanhar seu blog, deve ter muita coisa bôa.

Ricardo disse...

Olá, Clóvis,

Grato pela visita. Fico satisfeito por ter ajudado. A idéia é esta mesmo.

Abraços.

Unknown disse...

Nossa... sabe que eu e meu marido esperimentamos recentimente uma carne-de-sol que compramos por estar divinamente nos chamando a atençao em uma vitrine na beira de uma rodovia, aí nao resistimos e compramos. Mas depois de ler este texto é que parei pra pensar, estava tao deliciosa mais será de onde ela veio? Eca, nao quero nem pensar. Da próxima vez vou querer saber a procedencia, ou até mesmo prepará-la.

Ricardo disse...

Obrigada pela visita.

Carne de sol é um assunto complicado, mesmo.

Kim disse...

Bom dia.
Gostei do comentário que vc fez. Cliquei para ver a receita e o vídeo e fui direcionado para o site do programa MAIS VOCÊ da Ana Maria Braga, e não encontrei o vídeo. Se pudesse enviar via e-mail ficaria grato (kim.arcos@ig.com.br). Sou apreciar dessa iguária. E qto à higiena e a qualidade que você descreve, realmente tem que se tomar cuidado.

Marilene disse...

Olá Ricardo, td bem? Adorei suas informações sobre a carne de sol. Realmente tudo isso é verdade. Aqui em Minas é famosa a de Montes Claros, mais o preço é salgado tb. Como moro em Belo Horizonte, ultimamente descobri uma que vem embalada a vácuo no Super Nosso. Ela é da Frial. Comprei um parte de chã de dentro mas não tenho idéia de como utilizá-la. Você poderia me ajudar?Ah, não tenho churrasqueira. Um abraço Marilene

Anônimo disse...

bom dia ricardo

achei bom o seu cometário mas também vou lhe dar uma dica. mude seu cardápio, nem legumes e frutas compradas no supermercado ! estão infestados de agrotóxico de forma que também fazem mal à saúde. deixe de lado com urgência o saboroso churrasco plante você mesmo no fundo do seu quintal salsinha cebolinha alface e tomate e faça disso a refeição do seu dia-a-dia não se esqueça de fazer exercício regularmente e deixe de tomar cerveja. sua vida fai ficar dez e a sua família vai adorar !!!! parabéns geração saúde

castro disse...

esse cara é uma bichona se vc for fiacar pensando emtudo que ele escreve vc para de comer imediatamente e morre de fome,cara metido a sabe tudo

Ricardo disse...

Moço, retire sua alma das trevas. Tente ser um pouco mais educado, menos ressentido. O senhor deve sofrer muito, né, não?
Não perca seu precioso tempo comigo. Que tal começar gastá-lo para estudar e escrever melhorzinho?

Anônimo disse...

Boas Ricardo!Nunca fiz de picanha e no sal grosso, sempre usei sal refinado, há diferênça no processo? De qualquer modo irei fazer em breve essa receita e,com certeza retornarei ao seu blog com elogios.Abraços e até!

Anônimo disse...

**quero dizer o seguinte aqui em nossa cidade a carne não é tão cara, temos varios açougue e tres frigorificos por isso aqui fica mais facil fazer esta carne sem a preocupação de comprar gato por boi.

luciana disse...

Ô bichin e tarde demais eu ja ô e por demai acustamdo comer essa carne de jumento.

EDERICO disse...

É PRA SE LASCAR MEU VÉI!...UMA CARNE DE SOL COMO ESSA NÃO TEM QUEM NÃO GOSTE!...PODE SER COM A PROCEDENCIA DA CASA DE PANTANHA!... É ISSO!...